sábado, 20 de outubro de 2018

Clube Arribada | let's the classes begin

Decorridas as eleições, iniciámos finalmente as aulas de Ciência Computacional e Tecnologia da Conservação no Clube Arribada. Trabalhamos com uma das escolas de 2.º ciclo de Ensino Básico da cidade, Santo António II, por limite de capacidade e porque as crianças das roças e comunidades sofrem de maior dificuldade de transporte e, consequentemente, de assiduidade. 
Ao chegar à escola, são vários os desafios: a excessiva dimensão das turmas (entre 40 e 50 alunos); a escassez de professores e auxiliares, que dificulta a gestão da energia própria da idade; professores que chegam tarde, leccionando meio tempo de aula ou o que dela restar... E, para meu grande choque, as turmas organizam-se por idade. Por exemplo, os 5º A e B são compostos por crianças de 9 e 10 anos, o 5 ºC por crianças de 11 anos (que já perderam um ano) e por aí fora, por forma a compor turmas mais homogéneas. Ora, apesar de perceber os motivos inerentes a tal decisão, não deixa de me fazer confusão esta "receita para o fracasso" dos alunos com maiores dificuldades de aprendizagem. A influência e convívio entre diferentes níveis de conhecimento estimula o desenvolvimento da criança, pelo que me parece demasiado condenatório à partida. 
O sistema educativo parece-me bastante preocupante. Até há uns anos atrás, não havia ensino secundário no Príncipe e nem todos tinham possibilidade de ir para S. Tomé terminar o liceu. Hoje, essa limitação surge apenas ao nível do ensino superior. Mas, ainda assim, o nível de ensino parece deixar muito a desejar quando parece que basta terminar o ensino secundário para estar apto a ensinar uma ou outra disciplina. Há uma falta muito grande de professores e, apesar do subsídio de isolamento para incentivo à deslocação de funcionários públicos de S Tomé, não é fácil captar colaboradores para o Príncipe. As cooperações internacionais, nomeadamente com o Instituto Marquês de Valle Flôr, reforçam o corpo docente ao nível do ensino secundário. Contudo, os jovens chegam muitas vezes com uma grande falta de bases, sendo mais difícil a sua integração e acompanhamento da matéria.
Enfim, temos 16 lugares na sala e, portanto, desafiámos duas turmas de 5.º ano a participar no clube, dividindo cada uma delas em três pequenos grupos. Damos aulas práticas e procuramos desenvolver uma aprendizagem mais informal. As aulas são gratuitas, extra-curriculares e opcionais, não há sistema de avaliação e a permanência no clube é garantida pela assiduidade do aluno. Tentamos envolver os pais ou encarregados de educação dos alunos, para que os libertem das tarefas domésticas para poderem participar no clube e não faltarem sem justificação.
Recebemos 80 novas inscrições com grande entusiasmo, sobretudo por causa da utilização do computador - a que muitos só têm acesso no 10.º ano de escolaridade, na aula de TIC - que o professor Rafael se esforça por tornar apelativas e dinâmicas, apesar de só ter 4 computadores operacionais para 50 alunos... O Francisco e eu estamos a pensar numa estratégia para melhorar estas condições, espero em breve ter novidades. :)

sábado, 13 de outubro de 2018

Tira Foto

Seja pelas ruas da cidade de Santo António ou pelas comunidades adentro, embora um pouco mais reservados, a energia das pessoas é contagiante. Este jeito familiar, que faz lembrar as aldeias de Portugal, onde todos se conhecem e cumprimentam, acolhe-me tão naturalmente e faz-me sentir em casa quase que instantaneamente. Um "olá" aqui, um "boa tarde" acolá, os diálogos vão-se desenvolvendo apesar do hábito de poucas palavras: "como?" quer dizer "como está?"; "tudo" é "tudo bem"; "ainda" corresponde a "ainda não"...

As crianças correm atrás de qualquer interacção e o seu sorriso meigo rouba rapidamente o nosso coração, com um automático "tira foto" ou, nas mais ousadas, "dá-me doce" ou "dá lapiseira" - fruto do crescente turismo que, confesso, me faz alguma confusão. Não é por mal, bem sei, mas sem nos apercebermos, vamos estimulando pequenos actos de "mendigagem" e facilidade de estender a mão. Se ensinamos os nossos filhos a trabalhar para conquistar as coisas, porque não o fazemos com os filhos dos outros? 

Apelo a todos os meus amigos e familiares, que, nos seus actos altruístas e generosos, para cá ou qualquer outro sítio, envolvam por favor as entidades competentes, organizando doações com quem está no terreno - ONG, paróquia, Santa Casa da Misericórdia, entre outras - e conhece a realidade local. Ajudemos, claro, mas ajudemos a fazer crescer e desenvolver o país, ao invés de incentivar o "assistencialismo", que muitas vezes também é necessário, mas deve ser feito de uma forma organizada. Desculpem o  pequeno sermão, "mix feelings" ainda da adaptação à realidade local ;)

sábado, 6 de outubro de 2018

Behind enemy lines

Cheguei em plena campanha eleitoral, em eleições nacionais e regionais. É, por isso, um tempo bastante animado, de esperança, promessas e festa:
. Esperança q.b., pois não sinto grande envolvimento ou até interesse por parte da população (têm opinião, que manifestam de forma bastante acesa, mas não conhecem as intenções dos candidatos; simpatizam com um em detrimento de outro, mas se este outro ganhar também está bem...).
. Não consegui aceder propriamente aos programas eleitorais, mas fala-se nas ruas - sobretudo no banco da má língua, como é conhecido o banco da praça central, onde as pessoas se juntam às mais variadas horas para apanhar boleia, proteger do sol ou observar o ritmo da cidade - em melhorar as estradas, as redes de acesso a água e energia. Infelizmente, nada sobre educação ou saúde, que tanto escasseiam por aqui... Certamente que essas preocupações existem, simplesmente não predominam na vida diária das pessoas.
. Festa à boa moda africana, porque tudo é motivo para música e dança. Comícios, visita às comunidades, carros de campanha anunciam as atividades pelos bairros por onde passam. A juventude alista-se para participar na festa, vestida a rigor, mostrando o seu ritmo, entretendo e desafiando todos à sua volta.



Na Região Autónoma do Príncipe há três candidatos, mas a disputa dá-se sobretudo entre dois: o atual líder - que termina o seu terceiro mandato consecutivo - e um grande empresário da ilha. O atual presidente termina o terceiro mandato, estando no poder há, portanto, 12 anos. O povo está contente com o seu trabalho, mas acredita que é tempo de mudar e passar o testemunho. Diz-se, no tal "banco da má língua", que se rodeou de mais interesseiras e menos interessantes pessoas, que se acomodam à sua posição.
Eu, sinceramente, torço (interesseira e secretamente) pela menor alteração possível, apenas e só por questões operacionais do meu projeto. Preciso reunir com as secretarias de Assuntos Sociais e Educação, pelo que qualquer alteração implicará o atraso no início das aulas do meu projeto. Seja o que tiver de ser, para e pelo Príncipe.