sábado, 24 de novembro de 2018

Trust | Conservação e Sustentabilidade

A Fundação Príncipe Trust é a ONG local que me adopta indiretamente nesta minha missão, enquanto principal parceiro do projeto. E sim, digo "adopta" porque a ligação entre os diversos colaboradores, estrangeiros e locais, tem a força e o carinho dos laços familiares com que fui educada.
Originalmente, a Fundação foi criada pela HBD - principal empresa hoteleira da ilha, pertencente ao sul africano Mark Suttleworth, que se dedica ao turismo sustentável. Hoje, sem perder o apoio e ligação ao seu fundador, opera de forma independente, reunindo uma panóplia de apoios e patrocínios, consoante a área de actividade. 
Surgiu com o objectivo de preservar a biodiversidade da ilha, desenvolvendo inúmeros projectos de conservação marinha e terrestre. Procurando atingir o equilíbrio entre a natureza e o Homem, a Fundação Príncipe Trust visa promover o desenvolvimento económico e social das comunidades do Príncipe, de forma a capacitá-los para uma gestão de recursos mais eficiente e sustentável.
Conservação das tartarugas marinhas, promoção de apicultura sustentável, educação e sensibilização ambiental, identificação e categorização de espécies ameaçadas ou valorização de resíduos através da produção de joalharia com peças de vidro são algumas das inúmeras iniciativas que potenciam o desenvolvimento das comunidades locais. 

Esta semana, tive oportunidade de  conhecer com maior detalhe os resultados do projecto "Omali Vida Nón" - que quer dizer "o mar é a nossa vida" e se destina à conservação das áreas marinhas protegidas e fortalecimento das comunidades piscatórias -, acompanhando o Dário Pequeno Paraíso nas visitas de campo para elaboração de um pequeno documentário sobre o projecto. 

Tradicionalmente, os homens são pescadores e as mulheres palaiês (vendedoras), mas não necessariamente em parceria. Muitas vezes, senão na maioria dos casos, as mulheres compram o peixe aos seus maridos para venderem, directamente, fresco ou seco e salgado. Algumas perdem inclusive dinheiro neste processo - o que causa alguma confusão se pensarmos em termos de economia familiar -, mas é assim que a sociedade está organizada. Um dos principais impactos do projecto, que terminará em breve, foi, para mim, a promoção de ideias comunitárias, para lá da pesca,  para o desenvolvimento de fontes alternativas de sustento, das quais brotam dois negócios de sucesso: a bijuteria da praia Burras e os sabonetes artesanais da praia Abade. 
A minha aprendizagem da semana não fica, porém, por aqui... O Dário é um rapaz são tomense, que cresceu em Portugal e regressou há menos de meia dúzia de anos. Aliás, na verdade não regressou, mas anda agora entre cá e lá. Hoje, excelente fotógrafo e videógrafo, reconhece o privilégio em que  cresceu - sobretudo  quando  comparado  aos  seus pais -, mas com um crescimento bastante desafiante em vários aspectos. Uma história de vida incrível, que não me cabe naturalmente a mim contar, mas que estou extremamente grata por ter merecido tal confiança. Obrigada Dário, pelas partilhas, discussões e por tudo o que, mesmo sem querer e sem te aperceberes, me ensinaste. Estou inquieta para ver o resultado deste documentário. Sucesso!



sábado, 17 de novembro de 2018

Parque Nacional do Obô

Há seis anos, o Príncipe foi classificado como área protegida pela UNESCO e Reserva Mundial da Biosfera. Para explorar esta imensidão e beleza natural, encontramos julgo que sete Trilhos da Biosfera, que podemos explorar - preferencialmente acompanhados de guia, de forma a descobrir as suas maravilhas e a melhor preservar esta preciosidade. 
Estreei-me no #7 Oquê Pipi, um dos mais curtos e de menor exigência física, apesar de alguns trajectos mais desafiantes, que termina na fantástica cascata que lhe dá o nome. Terão de vir conhecer, pois as minhas fotografias não lhe fazem a devida justiça.

O caminho é incrível, surpreendendo-nos a cada passo pela densa floresta adentro. Beneficie da orientação do simpático Yodiney Santos, coordenador terrestre da Fundação Príncipe Trust e guia certificado, mais conhecido por Yodi. As enormes raízes do Oca, que não cabem no solo, estão por todo o lado, criando deliciosos recantos e protegendo outras espécies. O Yodi apresentoi-me várias espécies endémicas da região e outras tantas introduzidas pelo Homem, mas que nunca tinha visto até então. 

Apreciando sobretudo a paz e tranquilidade que proporciona, confesso que  não sou grande conhecedora da natureza, mas é impossível  ficar indiferente à paixão com que o Yodi partilha o seu conhecimento. Folha tatuagem, 'mulher portuguesa' ou 'não me toques' - divertido feto que se fecha ao tocar nas suas folhas -, pau água e uma dúzia de vagas e pequenos frutos cujo nome não lembro, são algumas das belezas que me chamaram a atenção, mas tenho a certeza que me escaparam outras tantas, pelo que terei de voltar para aprofundar a lição. Além do mais, há pelo menos mais seis trilhos a explorar! Aqui vou eu...



sábado, 10 de novembro de 2018

Praias de areia branca

Ainda não escrevi sobre o clima, que me tem inquietado bastante. Os 24°C indicados no termómetro parece-me 30°C, embora a humidade não seja tão forte quanto esperava. Já a chuva é mais que muita e abundante, não como as monções asiáticas que conheço. Aqui, não podemos deixar que a chuva condicione os nossos passos, ou não sairíamos de casa. Chove frequentemente a tarde toda ou até mesmo o dia inteiro.

Todavia, consegui finalmente usufruir por completo deste paraíso que me acolhe e explorar um pouco das belíssimas praias que me rodeiam, de areia branca e água cristalina. Algo que me transcende numa ilha vulcânica como esta é precisamente a cor da areia... Ainda estou para descobrir a origem.
Cada uma com a sua particularidade: a sofisticação do Bom Bom e Santa Rita, a floresta envolvente da praia Abelha, a simplicidade da praia Boi, entre outras tantas. Mas a que de facto me conquistou, e me quebra a saudade da apaixonante costa alentejana, foi a praia Banana, junto à Roça Belo Monte. Ainda estou para decifrar o quê, mas há qualquer coisa de mágico neste lugar, que me encantou desde que o avisei do miradouro acima...A praia é pequena, rodeada de coqueiros, com uma série de áreas próprias para snorkeling. Do Belo Monte pode ainda requisitar-se a utilização de caiaques, individuais ou duplos, e passear até ao hotel abandonado na praia Macaco. 
Apesar da reduzida dimensão da ilha, os acessos não são faceis, pelo que há que planear o dia em função da exposição solar. Descubro que a minha localização favorita deve ser melhor aproveitada pela manhã, embora me delicie com os últimos raios de sol da tarde numa rocha no meio do mar...
E por fim, nada como terminar o dia com um revigorante cocktail entre amigos, no miradouro do Belo Monte, com uma das melhores vistas sobre o por do sol. 
Do que estão à espera? Aventurem-se e venham conhecer este tesouro ainda meio escondido, que, julgo, não fica indiferente a ninguém que por cá passe.

sábado, 3 de novembro de 2018

Na sombra da Colonização




Por entre ruínas e a verdejante imposição da natureza que tomou posse do espaço, descobre-se o surpreendente tesouro arquitectónico das grandes roças de São Tomé e Príncipe, que representavam a grande base económica de ambas as ilhas até à independência. 
No Príncipe, parece que existiam quatro grandes unidades agrícolas - Sundy, Porto Real (que, segundo consta, produzia o melhor óleo de palma da ilha), Terreiro Velho e Infante - as quais englobavam quase duas dezenas de outras roças: São Joaquim, Paciência, Belo Monte, Nova Estrela, Santo Cristo, Montalegre, Azeitona, Santa Rita, Gaspar, Bela Vista, Nova Cuba, Ponta do Sol, Abade, Infante, Maria Correia, Lapa, entre outras... Ainda não conheço bem a sua história, mas apesar das particularidades individuais, julgo poder descrevê-las como uma enorme unidade agrícola com casa principal ou senhorial, sanzalas (casas dos trabalhadores), armazéns e outros edifícios de apoio à produção e um hospital (não sei se em todas ou apenas nas de maior dimensão. Em muitos casos, as roças principais eram suportadas por outras secundárias, espalhadas pela ilha.
Entre si, estendia-se um sistema ferroviário, que ligava e abastecia as roças principais e suas dependências. As estruturas são imponentes, de uma beleza incrível, que parte a alma ver ao abandono. Consta que, após a sua nacionalização, criaram-se cerca de 15 unidades agrícolas para dar continuidade à produção. No entanto, estas foram novamente deixadas ao abandono. Apesar de alguns esforços para a sua recuperação, a maioria permanece em decadência ano a após ano, talvez por dificuldades de gestão ou por afirmação/revolta. 
O peso do colonialismo faz-se sentir em conversa com algumas pessoas, as que se atrevem a falar sobre o tema. Achamos que a escravidão foi abolida no séc. XIX, mas parece que o trabalho forçado permaneceu até à nacionalização das roças, em 1974. Ainda assim, as opiniões divergem: há os que falam, naturalmente com mágoa, de avós em situação de escravidão, ao mesmo tempo que outros referem-se a tempos de trabalho árduo mas certas condições garantidas. Arrepia ouvi-los falar, não consigo imaginar o que pode ser crescer sem liberdade ou opção de escolha.
Por outro lado, entre as áreas da conservação e do turismo, ou mesmo pelas ruas, há uma admiração estranha pelo estrangeiro, uma submissão inerente que me faz bastante confusão. Como se os estrangeiros fossem mais aptos e melhores. Se nalgumas situações se verifica - sobretudo por maior qualificação e domínio de língua estrangeira -, acredito que a troca de experiências e conhecimentos é recíproca e igualmente rica para ambos os lados. Sabemos coisas distintas e aprendemos e crescemos em conjunto.